Eu sempre sento na frente do computador achando que vou escrever uma coisa e acabo escrevendo outra. Eu desvio. É que nessa vida de exposição, a gente sempre tenta ser perfeita e escrever tudo "programadinho". E é exatamente sobre isso que eu vou falar, perfeição (ou sobre imperfeição).
No meio de um texto sobre séries – ele vem logo mais, esperem -, eu conversava com alguém que me dedicou uma música. Na verdade, ela fez. Na verdade, fez pela metade. Ela fez a melodia e eu estava cobrando a letra, porque é o que eu sempre faço, cobro o passeio completo. Ela me disse que tinha arranhado alguma coisa, mas que não tinha conseguido, porque queria que a música fosse perfeita. Eu, como toda pessoa que faz terapia e tomou alguma consciência, mesmo que momentânea, de que não existe perfeição, disse a ela que não sou perfeita e que por isso, a música também não tinha que ser, já que era sobre mim (ou para mim).
Eu não sei se isso é uma peculiaridade do meu autismo inventado ou se eu realmente nasci com o olhar distorcido, mas eu acho – só acho – que eu vejo beleza é na imperfeição. Bom, no meu histórico amoroso, por exemplo, eu sempre me apaixono por aquela pessoa que tem alguma coisa "quebradinha", um lado B, uma história com muitas vírgulas. E no âmbito estético, é assim também. Eu não consigo ter tesão no famoso “padrãozinho”, eu acho bonito, mas pra ver de longe. Nada contra o "padrãozinho" também, pelo amor.
E ah, vai, não vou mentir. Eu gasto muito tempo e energia tentando ser perfeita. Isso porque eu cresci numa sociedade que me impõe que ou eu sou 100% boa ou eu não sou qualificada o bastante. E se você quer um depoimento cru e verdadeiro, eu falho. O tempo todo. Quando eu tento ser a amiga perfeita, a namorada perfeita, a filha perfeita, a profissional perfeita; porque até onde eu sei, não tem essa coisa de “Deus nos criou como imagem e semelhança da sua perfeição”. E eu acredito em Deus, não me tomem como cética. Mas é que no mundo real e humano, não tem como uma pessoa atingir um grau tão elevado que contemple todas as expectativas que criamos acerca de nós e do nosso entorno, nem que contemple as expectativas que os outros criam. E muito menos as expectativas que NÓS achamos que os outros criam (essa é a pior piração).
Aí é a hora que a gente cai naquele limbo de auto punição porque não conseguimos ser exatamente aquilo que projetamos ser o reflexo de um ideal. Idealizações existem pra alguma função maluca que eu ainda não sei qual é e talvez pra não entregarmos os pontos acreditando que “ah, já que não vai dar mesmo, não vou nem tentar”. É pra isso que criamos ilusões e sonhos que muitas vezes sabemos que não serão atingidos, ou pelo menos é pra isso que eu crio e vou falar por mim, já que não sou especialista em nada além da minha própria sabedoria de vida. E sei lá, eu só tenho 25 anos.
Num mundo onde a gente cobra o padrão de revistas e do que a gente vê na TV, eu acho que o bom são as rasuras... O bonito é a cicatriz que eu tenho na testa de quando eu me joguei pra passar da "gradezinha" que separava a sala da cozinha, o bom é tudo que eu mostro quando tô vulnerável. São nas minhas estrias e olheiras que você vai encontrar o que eu sou de verdade, sem maquiagem, sem o glitter do carnaval, sem os filtros dos aplicativos. Nas minhas celulites, nos meus choros sem fim ou nas conversas que eu travo quando eu tô bêbada às 3 da manhã. Nos 2 maços de cigarro que eu fumo por dia. E no meu riso frouxo quando eu tô nervosa e não sei o que dizer. É sério, eu às vezes rio até em funeral. Isso não é uma qualidade muito legal em certas situações. Vocês também têm as peculiaridades de vocês. Ou devem ter. E ok, eu fico puta quando eu como demais e não entro naquela calça jeans maravilhosa que ia ser perfeita pra tal ocasião. Ou então quando eu ensaio um diálogo completo no banho e chego na hora e tudo sai pela metade. Ou mesmo quando a resposta certa vem três segundos depois de já ter respondido. FICA AQUI O MEU AMÉM ÀQUELA FUNÇÃO DO WHATSAPP, APAGAR ANTES QUE A PESSOA LEIA. Ou quando eu tenho meus momentos de "sincericídio" e penso: "Maria, por que, linda? Era só ficar quietinha". Mas acontece que no final eu sou isso: café preto amargo e sem açúcar. Há quem goste. Há quem prefira as magazines: o corpo magro e sem dobras, a polidez na fala. Há quem prefira o programado. Iludidos, né? Porque a perfeição, caros leitores, não existe. Sinto muito se estou quebrando suas expectativas, mas eu juro que eu tô diminuindo uns anos de terapia pra você.
Não há texto bem pontuado se você não lê e corrige todos os seus erros. Ninguém consegue fazer isso consigo uma vida toda, corrigir todos as acentuações e trocas de palavras. O mundo não tem corretor do word. E cara, sinceramente, qual a graça se você não puder achar poesia nas imperfeições? Uma folha também é bonita, mesmo que corroída pelo tempo ou por insetos. Um muro pichado também tem história. Às vezes, você pode se deixar ser totalmente sincera, desde que isso não machuque ninguém. E vamos lá... viver é nada mais do que essa coisa cheia de emendas. Eu sigo com Cazuza: “raspas e restos, me interessam”.
Sim, eu desloquei o contexto da frase, mas acho que vocês vão entender. O mundo precisa da gente como seres imperfeitamente perfeitos que somos. E eu juro que eu vou ler esse texto de novo e tentar acreditar em tudo o que eu tô dizendo.
Maria Mangeth
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