Aurora da humanidade: o homo sapiens sai das cavernas. Começa a pensar, falar, dar sentido ao mundo, distinguir o dia da noite, o quente do frio e... o homem da mulher. Observadores, nossos ancestrais também perceberam que seus corpos tinham diferenças anatômicas, produzindo líquidos diversos – esperma num e sangue no outro. E que só a mulher tinha o poder de procriar.
Independentemente da forma pela qual as culturas se organizaram, a diferença entre masculino e feminino sempre foi hierarquizada. Mas, apesar de Adão vir na frente de Eva, a situação das mulheres mudou. Mudanças lentas, sem dúvida. Os anos 80 foram emblemáticos: elas entraram no mercado de trabalho, tomaram pílula e queimaram sutiãs. A revolução não ficou sem resposta. O nível de violência contra mulheres aumentou e houve até quem matasse a sua, por usar biquíni, fumar e assistir “Malu Mulher”. Contra as mudanças, o que foi considerado um “castigo de pecados”, caiu dos céus como um raio. A tranqüilidade sexual que vinha sendo conquistada sumiu, pois a Aids desembarcou no Brasil! Constatados os “equívocos da liberação sexual”, muitas delas voltaram rápido ao tradicional casamento, ainda uma das melhores opções em termos afetivos, econômicos e sociais.
As mulheres continuaram a conquistar postos de trabalho e competências, mas as diferenças prosseguiram. Em 1990, dados do IBGE revelaram que homens divorciados tinham quatro vezes mais chances de se casar novamente do que mulheres. O fenômeno foi chamado de poligamia seqüencial. Ao longo da vida, unir-se-iam a esposas cada vez mais jovens: no primeiro casamento, quatro anos de diferença, chegando a quase oito, nas uniões seguintes.
Recentemente, uma pesquisa perguntou a vinte casais da classe média carioca: "o que é casamento". A resposta de 95% das entrevistadas foi: uma relação de amor. A de 100% dos homens: a constituição de uma família. São visões diferentes e frustrações idem. Mulheres encaram a separação como uma conseqüência do fim do amor. Já para grande parte dos homens, o fato da relação não ser um mar de rosas não justifica um rompimento. Bem ou mal, eles têm uma família. A mola mestra da imensa maioria das separações é velha como a humanidade e, no entanto, atualíssima: a constatação de que o sexo oposto é exatamente isso – oposto.
Oposto e desigual. Apesar da proclamada igualdade das mulheres com os homens, - temos até presidenta! - vivemos uma longa tradição machista. E curiosamente, somos nós que a alimentamos. Estudiosos das revistas femininas, letras de músicas e imagens publicitárias demonstram que “uma mulher livre” não é absolutamente aquela que faz escolhas. Mas aquela que se conforma aos modelos da mídia. Ou seja, as leis mudam, mas o essencial continua intocado. Devemos perder a coragem e dizer que o machismo é indestrutível? Ou que um obstáculo não vai impedir o combate? O interessante é que a diferença de sexos é coisa sabida e esquecida. É evidente e invisível. Até quando? E qual a parte das mulheres nisso?
Mary Del Priore
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